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Quando a sua banda favorita muda de estilo. A arte de um rebranding gradual.

“Você traiu o movimento, veio”

Algo que sempre aconteceu e sempre irá acontecer no mundo da música são casos de bandas e artistas mudando do estilo que os consagrou na cultura pop. Pode-se dizer que todos os músicos fizeram ou irão fazer isso em algum ponto da carreira (com algumas exceções).

Mas afinal, isso seria algo ruim?

Olhando por uma ótica positiva, é bom quando artistas se desafiam e procuram fazer novas formas de arte. É preciso de muita criatividade e habilidade para ter sucesso em diferentes abordagens. 

Muitos artistas criaram uma carreira com inovação musical, sempre explorando diferentes estilos e se mantendo relevantes no imaginário popular. Dois dos casos mais bem-sucedidos certamente são os do artista David Bowie e da banda Queen.

David Bowie passeou por praticamente todos os gêneros de sua época: folk, glam, art rock, música eletrônica, jazz, etc., e obteve sucesso em todos. Em diferentes décadas, ele se manteve relevante. 

A banda Queen começou como uma banda de hard rock, e depois teve inspirações em pop, rockabilly, ópera e muito mais. O Queen tornou-se uma das bandas mais famosas do mundo ao inserir essa salada de influências em sua música. 

A experimentação foi um aspecto integral desses artistas que teve resultados muito positivos.

Mas olhando por uma ótica negativa, é possível perceber quando alguns artistas mudam o seu estilo por pressão de ainda se manterem “populares” aos olhos do público. 

Essa é uma experimentação forçada, que não nasce do impulso de criar uma nova arte, mas de se conformar ao que está popular no momento.

É o famoso “se vender”.

O CASO METALLICA

Um exemplo famoso, mas talvez um pouco injusto, é o da banda Metallica.

A banda norte-americana era uma das mais rápidas e agressivas dos anos 1980. Sua influência, no cenário do Metal, pode ser sentida até hoje com os seus quatro primeiros álbuns, em uma vertente batizada como “Thrash Metal”. 

Algo curioso ocorreu em 1990, quando o Metallica lançou o “Black Album”, um disco que ainda mantinha uma sonoridade pesada, mas que era muito mais acessível ao público, com a balada “Nothing Else Matters” se tornando o seu maior sucesso. (A ideia de uma balada romântica era impensável nos primeiros álbuns). 

Pode se dizer que, apesar de terem sido acusados de “se vender” na época pelos fãs mais radicais, com o “Black Album”, a banda buscou expandir a sua sonoridade, ainda mantendo sua essência em todas as faixas.

Mas o mesmo não pode ser dito dos três discos subsequentes, “Load” (1996), “Reload” (1997) e “St.Anger” (2003).

The Unforgiven 2 – uma das faixas de Reload (1997).

Aqui, a banda decidiu abandonar o estilo que os consagrou para buscar ainda mais uma sensibilidade popular, “Load” e “Reload” são discos bem pautados por sua época, soando mais como um Hard Rock típico dos anos 1990.

Apesar de terem alguns pontos altos, a maioria dos discos não agradou aos fãs. De nada ajudou a mudança estética também. Os cabelos grandes foram cortados, as roupas mudaram e o visual das capas deixaram de ter aquele estilo Metal. 

As mudanças deixaram bem claro que essa era uma banda diferente, e que não se conectava mais com o seu público-alvo.

A mudança de visual do Metallica não foi bem aceita pelos fãs.

O caso piorou com o lançamento de “St. Anger” (2003), que buscava ainda mais conformar-se ao que era popular no momento. Dessa vez, com inspiração do movimento “Nu Metal”, sucesso da época. 

O disco tirou alguns dos fatores que sempre foram essenciais ao Metallica, como os solos de guitarra e a sonoridade mais complexa das baterias. Esse último elemento se tornou uma piada com os fãs por soar como “latas de tinta”.

Frantic – uma das faixas de St. Anger (2003), que incorpora o estilo “Nu Metal”.

Apesar de ser consideravelmente mais agressivo que “Load” e “Reload”, “St. Anger” ficou conhecido como um dos maiores desastres feitos por uma banda famosa na história da música. 

Na busca por se manter atual, o Metallica nunca soou tão datado quanto nesse álbum.

O caso foi tão feio que os discos seguintes foram praticamente uma desculpa aos fãs por esses anos. Tanto que “Death Magnetic” (2008) e “Hardwired to Self Destruct” (2016) retornaram à sonoridade Thrash dos primeiros álbuns.

O CASO RADIOHEAD

Outra banda que mudou completamente o seu estilo, no decorrer dos anos, foi o Radiohead. Mas, nesse caso, o resultado foi muito mais positivo aos olhos do público e da crítica especializada.

O primeiro álbum da banda “Pablo Honey” (1993) era bem comum para a sua época, um rock alternativo que flertava com o movimento grunge. Mas tudo mudou com o lançamento de “OK Computer”, em 1997. 

O disco era bem mais experimental, com influências diversas e únicas. O álbum foi responsável por praticamente dar uma nova sonoridade ao rock alternativo. Várias bandas famosas, como o Coldplay e Muse, beberam diretamente dessa fonte e a citam como um divisor de águas.

Então, em 2000, no auge de seu sucesso, eles lançaram “Kid A”, que era ainda mais experimental e que abandonou completamente as guitarras para focar em sons eletrônicos e abstratos. 

Alguns fãs não conseguiram acompanhar as novas direções da banda, mas muitos embarcaram e seguiram firme para qualquer nova e diferente abordagem que eles mudariam no futuro.

Kid A (2000) foi para um lado completamente experimental e abstrato.

UMA QUESTÃO DE REBRANDING

O conceito de rebranding é ressignificar a imagem percebida de uma empresa ou produto. O objetivo é mudar a percepção do público em relação à marca. As ações podem envolver mudanças de nome, logotipo, identidade visual e outros elementos.

Há algumas características que devem ser consideradas quando o rebranding é necessário. Geralmente, vai se testando gradualmente algumas mudanças para conferir como o público reage. 

Se essa reação for positiva, é possível ir um pouco mais além. Raramente mudanças drásticas são bem recebidas de imediato.

Isso é algo que o Radiohead fez sabiamente. O “OK Computer” já havia sido bem diferente de seus primeiros álbuns, mas ainda manteve seu estilo e seu público satisfeito. Então, quando “Kid A” foi lançado, os fãs já estavam um pouco mais receptivos para experimentação (mesmo que ainda tenha uma parcela do público que tenha abandonado a banda nesse ponto).

No caso do Metallica, a mudança foi um tanto alienante, considerando que os fãs de Metal já são conhecidos por serem menos receptivos por natureza, e a mudança de visual e sonoridade foram súbitas demais. 

O próprio vocalista da banda, James Hetfield, admitiu, anos depois em entrevistas, que a mudança em ‘Load” foi um tanto forçada. E o guitarrista Kirk Hammett foi totalmente contra a remoção de solos em “St. Anger”, mas acabou cedendo.

O que ocorreu é que a banda teve que retrabalhar novamente a sua marca após essa tentativa, mas desta vez, revisitando sua antiga imagem perante ao público.

A lição que podemos tirar dessas duas situações é que em casos de rebranding, uma mudança gradual é sempre mais aceitável do que uma súbita, introduzindo aos poucos novas questões visuais, propostas sonoras e o “feel” da marca. 

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