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Falem bem ou falem mal, mas falem de mim

O caso curioso de A Pequena Sereia (2023).

Um assunto bem interessante e controverso nos últimos anos é a questão de representatividade nos filmes, especialmente em reimaginações de filmes clássicos, em que personagens mudam de etnia.

Esse é um assunto extremamente complicado, e vamos tentar abordar da forma mais cirúrgica possível, sabendo que há diversas opiniões diferentes sobre essa questão.

E aqui nos metais tem peixe demais
Esperem que temos mais…

O mercado de live-actions da Disney tem sido extremamente lucrativo desde o lançamento de Cinderela (2015), um dos primeiros remakes em live-action de uma animação clássica. 

Logo foram feitos Mogli – O Menino Lobo (2016), O Rei Leão (2019), Aladdin (2019), Mulan (2020) e vários outros.

Com isso, um remake de A Pequena Sereia, filme que abriu portas para a “Segunda Era de Ouro” da Disney no final da década de 1980, era inevitável.

Esse mercado da nostalgia é algo que já abordamos diversas vezes aqui, o original é um desenho que muitas pessoas cresceram assistindo, e como remete a infância, é quase como se remetesse a algo sagrado, dourado, perfeito e imutável.

Então uma reimaginação dessa obra já levanta várias questões para aqueles que amam o original.

Obviamente, o remake de A Pequena Sereia busca duas coisas, revitalizar o interesse do filme para uma nova geração, e acender a curiosidade nostálgica de pessoas que cresceram com o filme original.

Mas como todos os remakes, há algumas mudanças.

Se os peixes querem ver o sol
Tomem cuidado com o anzol…

A principal mudança foi trocar a etnia da protagonista Ariel, que no original é branca, de olhos azuis e cabelo vermelho, para uma atriz e cantora negra, Halle Bailey.

Trocar a etnia de um personagem não é nada novo em adaptações de Hollywood, um exemplo que podemos citar é o personagem Nick Fury, que originalmente era branco nos quadrinhos, mas mudou para um visual inspirado no ator Samuel L. Jackson na era Ultimate, e foi consequentemente interpretado pelo ator nos filmes da Marvel.

Vários outros personagens tiveram a etnia alterada, principalmente em adaptações de quadrinhos, como Heimdall (Idris Elba), Tocha Humana (Michael B. Jordan) e Rei do Crime (Michael Clarke Duncan).

Mas vale dizer que esses são personagens secundários, raramente isso ocorre com protagonistas. 

A questão aqui é a representatividade. Por muitos anos, houve poucos personagens de etnias diferentes na mídia, a primeira princesa negra da Disney apenas teve um filme em 2009 (A Princesa e o Sapo), foram praticamente quase 100 anos de história em que só tiveram princesas brancas na Disney.

Inclusive, a empresa já teve um histórico ruim de representatividade em seus filmes mais antigos, muitas vezes com caricaturas e estereótipos de pessoas de etnias diferentes, como no filme A Canção do Sul (1946).

A Canção do Sul (1946) é um dos únicos filmes do estúdio que jamais entrará na Disney Plus.

O mundo humano é uma bagunça
A vida submarina é bem melhor do que tudo que eles tem lá…

A importância da representatividade é expandir a forma de pessoas de diferentes etnias se sentirem representadas na tela. 

Mas há uma certa parcela de pessoas que considera isso uma bobagem, argumentando que deveriam ser criados novos personagens para então fazer essa representação, ao invés de substituir a etnia de personagens clássicos.

O curioso, é que por muitos anos, especialmente em Hollywood, até mesmo personagens (ou figuras históricas) de diferentes etnias eram interpretados por pessoas brancas.

Vale lembrar de Marlon Brando como Emiliano Zapata, ou John Wayne como Genghis Khan (sim, esse filme realmente ocorreu). 

O americano John Wayne fazendo o papel da figura histórica asiática Genghis Khan em Sangue de Bárbaros (1956).

Obviamente, isso é um reflexo do racismo da antiga Hollywood, mas até hoje esse tipo de prática acontece, chamado de whitewashing. E apesar de haver alguma controvérsia quando ocorre, nunca é tão grande quanto o caso de A Pequena Sereia e outros.

Aqui no mar (aqui no mar)
Aqui no mar (aqui no mar)

Quando o trailer de A Pequena Sereia foi lançado no YouTube, logo vieram vários dislikes e comentários negativos, muitos nem falando sobre a qualidade do filme em si, mas sobre a aparência da atriz escolhida.

Isso abriu mais uma vez essa longa discussão sobre representatividade no cinema, 

Mas algo curioso também ocorre aqui, quando mais o filme é falado, mesmo que negativamente, maior é o seu engajamento.

Logo, um filme simples feito para público infantil se torna o mais discutido do ano. Quem concorda com a ideia de representatividade, provavelmente irá assistir com o intuito de defendê-lo.

E pessoas que discordam desse pensamento, vão comentar tanto sobre o filme, que praticamente estarão fazendo uma propaganda involuntária para o mesmo.

É o famoso, fale bem ou fale mal, mas fale de mim.

Obviamente, em publicidade, ser infame não é uma boa coisa. Mas nesse caso específico, pode ser algo lucrativo.

Inclusive, é bem provável que essa escolha tenha sido feita deliberadamente pela Disney, sabendo que isso traria mais engajamento para o filme.

Temos a bossa que é toda nossa
Aqui no mar…

É bem possível que A Pequena Sereia tenha uma boa margem de lucro em seu lançamento, mesmo que falhe nas bilheterias, ainda há a questão de exibição em sua plataforma de streaming, a Disney Plus.

A recepção crítica da maioria dos remakes do estúdio sempre foi de mediana para baixo, e isso nunca impediu os filmes de serem extremamente lucrativos. 

Basta ver a nota do site Rotten Tomatoes para o remake de O Rei Leão (2019), que teve apenas 52% de aprovação. Sua bilheteria foi de 1,6 bilhões de dólares, atualmente a décima maior da história.

Além disso, estamos falando da Disney, um dos maiores conglomerados do mundo, mesmo que o filme fosse um fracasso, seu prejuízo seria uma gota de água a menos no oceano de dinheiro que o estúdio fatura.

Em suma, independente se o filme for bom ou ruim, ou se a questão de representatividade é realmente honesta ou não nesse caso, a questão de engajamento já está ganha. 

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